Um dos escritores portugueses mais mediáticos aceitou o desafio de descobrir o Alentejo com o Visit Portugal.
José Luís Peixoto nasceu em 1974 em Galveias, concelho de Ponte de Sor.
A sua obra abrange vários géneros, da narrativa ao teatro, do romance à poesia, e foi distinguida com diversos prémios literários tais como o Prémio José Saramago, o Prémio Libro d’Europa e o Prémio Oceanos.
Os seus livros estão publicados em mais de 30 idiomas.
Talvez para aquelas aves regressar ao Tejo também seja um início, começam ali alguma coisa.
Não recordo o fim. Em Monsaraz, caminhando pela Rua Direita, com o castelo lá ao fundo, as pedras determinavam os passos. Levava todo este tempo, milhões de anos no mármore, séculos na arquitetura, anos nas velharias do mercado, dias nas memórias fortuitas do caminho que iniciei no Tejo, ainda na colado à pele. E logo ali, enquanto avançava, a algumas dezenas de metros, distingui três homens sentados. Ao aproximar-me, os seus pescoços moviam-se à velocidade lenta com que eu caminhava, não perdiam um detalhe. Precisei de ganhar coragem. Bom dia, estas palavras, tão simples, tão quotidianas e, no entanto, a minha voz a planar como uma ave, eu a afastar-me de mim próprio, a ousadia e a incerteza de existir. Mas, logo a seguir, bom dia, em coro, a resposta desses três homens, como se fosse todo o Alentejo a responder-me, a aceitar-me. Não recordo o fim. No topo da torre do castelo de Monsaraz, o céu, os campos, o montado, sons ao longe, pássaros que aproveitavam a distância. E a certeza de que o Alentejo não tem fim. Quando terminar o Alentejo, é porque terminou tudo o que existe.
As andorinhas têm sempre um lugar para onde ir, e têm pressa, não conseguem bater as asas mais devagar.
O que o surpreendeu nesta viagem?
Ter a oportunidade de me dedicar exclusivamente a olhar para lugares que, de um modo geral, já conhecia bem, foi marcante. Creio que me permitiu perceber de uma forma mais consistente todo o vínculo cultural e histórico que compõe a coesão deste território. A riqueza histórica, paisagística e humana do Alto Alentejo é extraordinária e, em constantes detalhes, acaba sempre por surpreender.
Conte-nos algo que tenha visto e que nunca tinha visto antes.
Poderia dar vários exemplos. Posso referir o Tejo dos Avieiros, com a incrível beleza das aves migratórias. Conhecia essas paisagens de descrições literárias, ter oportunidade de testemunhá-las ao vivo, com toda a sua solenidade é algo que não esquecerei. Ou, também, as ruínas de Ammaia, no concelho de Marvão, que foram uma descoberta absoluta para mim. Foi fascinante visitar esse espaço, recebendo todas as explicações e imaginando o tempo em que aquele espaço estava plenamente ocupado por uma vivência de matriz romana. Acabei inclusivamente por escrever um texto sobre isso, que publiquei na revista Volta ao Mundo.
Se tivesse de contar a uma criança sobre a sua viagem, o que diria?
Diria que, muitas vezes, sob aquilo que já vimos muitas vezes, existem histórias incríveis. Os lugares onde estamos, as salas ou as ruas onde estamos, têm um enorme passado. Prestar atenção a tudo isso é, também, viajar.
Qual foi o maior desafio e a maior recompensa desta experiência?
Creio que o maior desafio foi absorver e, depois, condensar a enorme quantidade de informação que encontrámos. Em simultâneo, a maior recompensa foi refletir sobre essa informação, processá-la, senti-la a fazer parte de mim.